adeptos-logo
Modalidades
01/07/25

Do campo de refugiados à NBA: a jornada inspiradora de Khaman Maluach

Dos becos poeirentos do Uganda aos palcos iluminados da NBA, passando por noites sem dormir a ver vídeos no YouTube: o percurso de Khaman Maluach é um hino à resiliência. Aos 18 anos, tornou-se a décima escolha do Draft e deixou o mundo em lágrimas.

Era uma tarde como tantas outras em Kawempe, um subúrbio empobrecido da capital ugandesa, quando um motociclista parou diante de um miúdo de 13 anos com estatura incomum. Olhou para ele e lançou um conselho que mudaria tudo: “Em três ou quatro anos, vais ser uma pessoa muito alta. Devias tentar o basquetebol”. 

Veja também: A mensagem de Ronaldo ao Sporting que encantou os sportinguistas

Cinco anos depois, no Barclays Center, em Brooklyn, esse presságio tornou-se realidade. Khaman Maluach, 2,18 metros de altura, foi escolhido na 10.ª posição do Draft da NBA. Primeiramente pelos Houston Rockets, mas rapidamente transferido para os Phoenix Suns no âmbito do negócio Kevin Durant. É em Phoenix que começará a carreira entre os gigantes do basquetebol mundial

Crescer no meio do caos: um campo de refugiados, sete irmãos e um sonho improvável 

Nascido em 2006 no Sudão do Sul, Maluach viu-se obrigado a fugir para o Uganda devido à guerra civil que devastou o seu país. Cresceu com a mãe e seis irmãos num campo de refugiados em Kawempe, onde o basquetebol era apenas um sonho longínquo. 

Não havia bola. Nem cesto. Nem sapatilhas. Mas havia vontade. 

Veja também: Sporting prestes a fechar transferência milionária de Diomande

«O campo mais próximo ficava a uma hora a pé e estava quase sempre cheio», contou à BBC Sport Africa. Ainda assim, à meia-noite, altura em que os dados móveis ficavam mais baratos, Khaman e o irmão faziam o chamado “turno da noite”. Viam vídeos de Giannis Antetokounmpo e Joel Embiid no YouTube — gestos técnicos, movimentos, inspirações. 

«Se eles conseguiram, eu também consigo», repetia para si próprio. 

Até que um dia foi. Caminhou uma hora até ao campo e viu rapazes altos, felizes, a jogar. Pegou finalmente numa bola. Tinha 13 anos. E não mais largou

Sem sapatilhas, com crocs e com fé 

O talento de Maluach rapidamente chamou a atenção de Wal Deng, ex-jogador dos Chicago Bulls e atual presidente da federação do Sudão do Sul. Deng convidou-o para um acampamento de basquetebol. Tentou calçá-lo com sapatilhas — mas não havia número 48. O miúdo jogou com as crocs do dia-a-dia

«Vi logo que ele era especial. Ele quer a grandeza e sabe o que é preciso para lá chegar. Aprende depressa e é humilde», contou Deng. 

Veja também: Más notícias para Gyökeres: Arsenal prestes a fechar avançado por 75M€

Com 14 anos, ganhou uma bolsa para a Academia NBA África, no Senegal. Deixou a família para trás e passou dois anos sem os ver. Mas ganhou estrutura física, formação académica e técnica de elite

Com 15 anos, estreou-se na Liga Africana de Basquetebol. Aos 16, já era internacional pelo Sudão do Sul. Foi o jogador mais jovem do Mundial de 2023, onde ajudou o país a qualificar-se para os Jogos Olímpicos de Paris 2024

De Duke para o mundo 

Após os Jogos, em 2024, assinou com a prestigiada Universidade de Duke, nos Estados Unidos. Já era bem conhecido por lá. Troy Justice, vice-presidente sénior da NBA, ainda se recorda do primeiro vídeo de WhatsApp enviado por um olheiro da Academia NBA África: «É impressionante. Um rapaz de 14 anos, com quase zero experiência de jogo, mas com um potencial gigante». 

Maluach não esquece o impacto de ver Zion Williamson nos vídeos. Quando explicou aos primos que jogava por Duke, ninguém percebeu. Mas quando disse que era “a universidade do Zion”, todos acharam “fixe”. 

Veja também: Brasileiros incluem jogador do FC Porto no pior onze da fase de grupos do Mundial de Clubes

A noite que emocionou o mundo 

Na noite do Draft, a 26 de Junho de 2025, vestia um blazer forrado com as bandeiras do Sudão do Sul e do Uganda. Quando Adam Silver anunciou o seu nome, as lágrimas escorreram-lhe pela cara. 

«Toda a minha jornada passou pela cabeça. A minha família, o meu povo. Estou aqui a representar todo o continente africano. Mesmo quando tudo parecia impossível, acreditei», disse, comovido. 

Em Entebbe, no Uganda, a família explodiu em festa: danças, orações, lágrimas. Mas ninguém conseguiu viajar. Devido a sanções dos tempos de Trump, os familiares e treinadores ficaram em África. Só a irmã, residente na Austrália, pôde estar presente

Wal Deng viu tudo pela televisão. Chorou. «Ele é um símbolo de esperança para África», confessou. 

Veja também: Reino Unido apresenta “Passear Cães” como desporto radical.

Um embaixador de África

Maluach prometeu enviar o boné do Draft aos treinadores que o formaram. Quer inspirar jovens africanos.

«Quero mudar a narrativa sobre África. Temos culturas ricas, cidades vibrantes como Kigali e Dakar, paisagens incríveis. Quero mostrar o lado bom do continente. E quero que mais crianças tenham oportunidades como eu tive. Não é preciso magia — é acreditar, sonhar e trabalhar. Eu também pensei que era uma ilusão. Mas agora estou na NBA». 

Já deu uma vista de olhos aos vídeos apaixonantes do canal de YouTube do Adeptos de Bancada? Está convocado a fazer parte da nossa equipa! Subscreva o nosso canal aqui!

André Miguel Rodrigues